De uma forma ou de outra, o mundo já estava dando sinais de mudança. Nosso ritmo de vida acelerado claramente não seria sustentável a longo prazo. A grande verdade é que relaxar e quebrar a rotina não é um luxo, é uma necessidade. E é justamente esse o papel das viagens em nossas vidas.
Uma vida equilibrada se resume a estarmos ‘on’ quando estamos trabalhando e ‘off’ na hora de relaxar. O famoso ‘desconectar para conectar’. Essa necessidade ficou ainda mais evidente quando fomos obrigados a ficar em casa. Apesar das preocupações decorrentes do lockdown, muitos de nós tivemos tempo para aliviar a pressão mental e reavaliar nossas prioridades. Viajar (sozinho ou com a família) voltou ao topo da lista de muita gente. Por alguma razão, isso não nos surpreende.
Mas se antes as pessoas buscavam roteiros agitados, repletos de pequenos tours por vários países e cidades (sem se importar com a falta de tempo para realmente apreciar cada um deles), o que elas buscam hoje é bem diferente. Além de avaliar com mais atenção os motivos para se deslocarem, elas também voltaram a compreender a importância de viver intensamente cada momento fora do trabalho e de nossas casas.
Uma tendência que indica que nossas viagens daqui pra frente terão muito mais propósito.
Viagens curtas
Enquanto as viagens internacionais ficam limitadas por um período, as famosas ‘escapadas’ para destinos próximos se tornam excelentes alternativas para quem planeja começar a sair de casa agora no segundo semestre. Essa é uma das grandes tendências que já estamos vivenciando, e que vem de encontro a esse novo comportamento.
“As viagens para fora se tornarão mais especiais, em decorrência tanto da insegurança quanto da desvalorização de nossa moeda. Não acredito que deixaremos de viajar, mas viajaremos menos, e de maneira mais simples” é o que afirma o empresário argentino radicado no Brasil, Facundo Guerra.
Off-line
Nas últimas duas décadas, nos vimos completamente absorvidos pelo universo digital. É claro que o acesso à tecnologia é maravilhoso e nos trouxe muitas vantagens, inclusive na hora de viajar. Mas nada em excesso é bom, né?
O aumento significativo das buscas por destinos na natureza, afastados das grandes metrópoles (em alguns casos até livres de wi-fi) é prova disso. As pessoas estão mais conscientes e não querem replicar um comportamento automático em suas viagens.
“Depois de termos nossas relações mediadas pela tecnologia, precisaremos nos desconectar para nos reconectarmos com algo maior”, reflete Facundo Guerra, que inclusive optou por investir em um refúgio próprio para se desconectar com frequência na represa de Piracaia (um lugar remoto do interior de São Paulo).
Viagens ao ar livre
Depois de um confinamento de muitos meses em ambientes fechados, viagens revigorantes e inspiradoras para destinos ao ar livre e em contato direto com a natureza serão nossa preferência.
Amazônia, Jalapão e algumas praias do Nordeste como Caraíva, Trancoso, Milagres, Boipeba e Morro de SP são considerados ‘destinos tendência’. Assim como nós adoramos viajar para outros países, um grande número de estrangeiros fomenta o turismo brasileiro. E enquanto as fronteiras estão fechadas, a gente pode aproveitar para dar uma escapada e conhecer as belezas do nosso próprio quintal.
“Sinto que é a experiência que vai mudar”, antecipa a consultora de criatividade Cristina Naumovs. “Talvez a gente viaje menos? Sim, mas vamos viajar melhor. Acho que quem entendeu a gravidade do que está acontecendo no mundo inteiro – e principalmente no Brasil – vai querer fazer de um passeio de São Paulo até Santos para molhar o pé na água ou almoçar à beira-mar algo excepcional. Parece um pouco hippie, mas tenho a esperança de que vamos estar mais presentes.”
Slow travel
Presença é a chave da ‘slow travel’. Aqueles momentos únicos, sem pressa, que a gente simplesmente não encontra online.
A tendência é viajar com calma, passando por menos lugares, mas com total consciência. Viver cada momento, experimentando a cultura local, mesmo que seja no nosso próprio país. O objetivo é prestar atenção em todos os detalhes que formam a essência de cada lugar, estando abertos para novas sensações e transformações que só acontecem quando viajamos, independente do destino.
“Um pouco brincando e um pouco a sério”, Luiz Horta, jornalista especializado em vinhos, gastronomia e viagens, prevê a volta das viagens lentas, em que os transatlânticos e os aviões menores, com menos autonomia de voo e mais escalas serão usados novamente como meio de transporte. “Talvez o lado positivo seja este, a ‘slow travel’, em que iremos a menos lugares e passaremos mais tempo neles, contra estas ‘fast visits’ que eram a prática antes da crise.”
Será então o fim das excursões?
Ainda não sabemos quanto tempo teremos que nos privar de ‘aglomerações’, mas Horta também antecipa o fim das famosas excursões.
“Tenho dito que as viagens continuarão, mas o turismo de volume acabou. As pessoas continuarão viajando porque é uma prática humana desde Plínio, o velho, no século 1 d.C., que viajava para provar comidas, conhecer lugares e a quem devemos relatos preciosos sobre a vida de 2 mil anos passados.”
Parece que o próprio Plínio já praticava ‘slow travel’, mas se voltaremos ou não a fazer viagens em grupo ainda é uma incógnita.
Respeito
Um dos valores mais importantes do ser humano e fundamental em qualquer interação social.
Com experiências de viagens mais consideradas, as pequenas gentilezas como ‘bom dia’, ‘por favor’, ‘obrigado’ e ‘com licença’ fazem toda a diferença. Além de algum conhecimento básico sobre a cultura, os costumes, o idioma e a gastronomia dos locais a serem visitados.
Após um período onde o contato físico e a interação social nos mostraram um certo ‘risco’, valores humanos como o respeito voltam a ser ’tendência’. Claro que o respeito pelos locais e boas maneiras não são um novo protocolo, mas sem dúvida serão cada vez mais valorizados. Nossa atitude para o enfrentamento da crise pode e deve ser levada para todas as áreas de nossas vidas, inclusive para nossas viagens.
Nós jamais saberemos os motivos que levam cada localidade a definir seus protocolos que vão do horário de funcionamento até a forma de se vestir. Algumas regras podem ser bem diferentes das nossas, mas a partir do momento em que entramos em território alheio, cabe a nós simplesmente respeitá-las em todas as situações.
Se no pós-pandemia nós pensarmos e agirmos com o mesmo respeito que estamos tendo na situação atual, o futuro do turismo além de ser mais sustentável, será incrivelmente lindo e muito promissor.
Pelo menos por aqui é o que acreditamos.
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